segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Homenagem ao Almirante Negro no cortejo do dia 19

João Cândido, líder da Revolta da Chibata, será lembrado em ato do Sindicato no próximo dia 19 São Paulo

“Salve o navegante negro, que tem por monumento as pedras pisadas do cais.”

O refrão de Aldir Blanc e João Bosco ficou famoso na voz de Elis Regina, mas não são muitos os que sabem a quem ele se refere. A música O Mestre-Sala dos Mares homenageia um dos mais importantes heróis do movimento negro no país, o marinheiro João Cândido Felisberto, que liderou a Revolta da Chibata em 22 de novembro de 1910, no Rio de Janeiro. O levante protagonizado por marinheiros negros – na época 90% do contingente da Marinha do Brasil era formado por negros – foi contra os castigos físicos impostos, especialmente o uso da chibata.

João Cândido, o “Almirante Negro”, é um dos três homenageados este ano no cortejo pelo Dia Nacional da Consciência Negra (20 de novembro), que o Sindicato realiza há 10 anos pelas ruas do Centro. Os outros dois homenageados são Seu Nenê, fundador da escola de samba Nenê de Vila Matilde, morto no último dia 4 de outubro, e o orixá de 2010 na umbanda, Ossain, o senhor das folhas.

Pela primeira vez o cortejo, que este ano será realizado no dia 19, será temático. A ideia, segundo a Secretaria Cultural do Sindicato, é resgatar a história do país homenageando personagens e heróis da luta e da cultura negra. O orixá também será lembrado como símbolo do sincretismo religioso brasileiro, herança da forte influência africana no Brasil.

Almirante negro – Filho de ex-escravos, João Cândido nasceu em 24 de junho de 1880, no interior do Rio Grande do Sul. Entrou na Marinha Brasileira aos 14 anos de idade e em 15 anos de Armada destacou-se como um dos melhores oficiais com diversas viagens no currículo por pelo menos 15 países do mundo. Admirado pelos companheiros de corporação e muito elogiado por seus superiores, João Cândido era um líder natural e como tal foi o escolhido para liderar a revolta.

Apesar da escravidão ter sido abolida 22 anos antes, em 1888, e do uso da chibata como castigo ter sido proibido em decreto do regime republicano, em 1889, a Marinha ainda punia os marujos com o instrumento (espécie de chicote). Homens livres e a serviço de seu país, os marinheiros ainda eram tratados como escravos, açoitados violentamente nos navios, na frente de toda a tripulação. Esgotadas as tentativas de resolver o problema na diplomacia – João Cândido chegou a representar os marinheiros em audiência com Nilo Peçanha, antecessor de Hermes da Fonseca, o presidente em 1910 – os navegantes organizaram o levante. No dia 22 de novembro, os navios de guerra Minas Gerais, São Paulo, Bahia e Deodoro aportaram na baía de Guanabara e apontaram seus canhões para a cidade do Rio de Janeiro, na época capital do país. O levante, que durou seis dias e no qual seis oficiais foram mortos, arrancou do governo o compromisso de acabar com a chibata. No dia seguinte, no entanto, o governo promulgou um decreto determinando a expulsão de marinheiros que representassem “risco”, numa clara retaliação aos revoltosos.

João Cândido foi expulso da Marinha e preso em dezembro de 2010. Nunca conseguiu em vida a anistia nem a reintegração. Foi solto e novamente preso por um período anos depois, sofreu privações pelo resto de seus anos, quando se sustentou como estivador e descarregando peixes no cais do Rio de Janeiro. Morreu pobre e esquecido aos 89 anos, em 1969, no Rio.

Uma estátua de João Cândido ocupa a Praça Quinze de Novembro, no Centro do Rio. Em 2008, o líder da Revolta da Chibata e seus companheiros conquistaram anistia. A lei do Senado foi vetada, no entanto, na parte que determinava a reintegração dos marinheiros já falecidos sob o argumento de que representaria custos para a União que teria de pagar os benefícios devidos a seus descendentes. O argumento foi acatado ainda que somente duas famílias tenham se apresentado como descendentes dos revoltosos, uma delas a do próprio João Cândido.

Andréa Ponte Souza - 12/11/2010

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